Hell Bent - Review

08-12-2015 16:00

O final da temporada. O episódio que tudo prometia. A continuação de uma excelente história e o culminar de vários arcos narrativos com potencial, incluindo o regresso de Gallifrey! Era difícil estar à altura das expectativas, e o episódio não me surpreendeu por não conseguir. Surpreendeu-me pela direcção que tomou, e pelas escolhas feitas por Moffat, que não resistiu aos seus tiques pessoais no que toca ao argumento.

Deixem-me explicar. Eu gostei do episódio. Mas não adorei, como aconteceu com a maior parte dos episódios desta temporada. Também não odiei, como odiei The Woman who Lived, nem fiquei reticente como com Sleep No More. Simplesmente gostei, e por motivos óbvios. Personagens direitinhas do The Day of the Doctor, o próprio Rassilon, a Sisterhood of Karn (embora não se perceba o que raio é que elas estavam ali a fazer… e não, Moffat, respostas sassy não contam como explicação), o Doctor em Gallifrey!

 

Aquilo que eu mais queria era um episódio inteiro disto. Nada melhor para um whovian inveterado, que segue religiosamente a série e que tem um estranho fascínio por este épico que começou em 1963, do que a premissa deste episódio. Em Heaven Sent o Doctor esteve preso dentro do seu próprio Confession Dial durante vários biliões de anos, o que se revelou apenas uma forma que os Time Lords arranjaram para que ele confessasse o que sabe sobre o famoso Hybrid. No final conseguiu sair e pôr os pés em Gallifrey, mas sem grande paciência para o que quer que fosse.

Neste episódio descobrimos o que fez a seguir. E a primeira parte do episódio (que é quase um episódio completo, já que este dura uma hora) é bastante boa. Excelente, até. Cheio de referências subtis (a minha namorada não me deixou escapar que quando lhe disseram “Drop any weapons!”, o Doctor largou a colher da sopa, numa referência daquelas que sabe bem, ao terceiro episódio da temporada anterior, Robots of Sherwood), momentos brilhantes da parte de Capaldi, e um Doctor com um ar perigoso como nunca o vimos antes.

Durante a primeira parte há tempo para tudo: para comandar uma pequena revolução silenciosa, enviar Rassilon, o Presidente, para o exílio, tomar o seu lugar e ser ameaçador de uma forma geral. É preciso dar a mão à palmatória, aqui. Se Moffat decidisse que toda a próxima temporada seria passada em Gallifrey, eu estaria perfeitamente satisfeito com isso. Esta meia hora foi uma das melhores meias horas que já passei a ver o programa.

Infelizmente a segunda parte estraga um bocado as coisas. Já todos conhecíamos a fixação que Moffat tem na personagem de Clara, que quase desde o início que é motivo de discussão entre os fãs. Pessoalmente nunca fui o maior fã: até gostei mais dela antes de ser a versão “original”, especialmente a versão Victoriana que aparece em The Snowmen. Mas é difícil não concordar que foi uma personagem que ficou demasiado tempo, e que até teve várias boas oportunidades para sair em grande que não foram aproveitadas.

Mas a segunda parte deste episódio faz algo pior, apesar de ser aquele em que a personagem desaparece definitivamente (espero eu). Não só a traz de volta como uma zombie temporal, como transforma todo o episódio numa longa história de despedida. Além de mudar o sentido a Heaven Sent. De repente, todo o tempo passado pelo Doctor dentro do seu Confession Dial é dedicado a recuperar Clara, num estratagema elaborado, improvável e nascido de uma resposta puramente emocional e que levanta muitas questões, como por exemplo, porque raio opta por fazer aquilo daquela forma, para Clara, e não com qualquer outra das pessoas que teve um fim desagradável?

Melhor ainda: por que raio é que não foi esperto, como costuma ser, e não se limitou a manter-se como Presidente de Gallifrey, herói de guerra, respeitado e obedecido por todos, e não trouxe Clara de volta passado uns tempos, no seu tempo livre. Nada deste esquema fez sentido.

E depois há o final. O final. Não só traz Ashildr de volta (uma personagem completamente supérflua) como lhe dá um final inesperado, juntamente com Clara, e invalida praticamente todo o arco narrativo do Hybrid que a temporada tanto se esforçou para esfregar nas nossas caras.

As únicas duas coisas verdadeiramente positivas deste final foram a forma como as coisas correram para o próprio Doctor, que experimenta um pouco do seu próprio remédio e perde a memória da sua mais recente companion, e as novas direcções que ficam abertas para o programa. Gallifrey está aí e está acessível, o Doctor esteve lá e saiu de lá numa Tardis, e tecnicamente tornou-se no Presidente de Gallifrey.

Para final de temporada, está bom. Para episódio de Doctor Who, está razoável. Como episódio do Moffat… Bem, vou-lhe dar uma abébia, já que esteve realmente excepcional durante a maior parte do tempo, mas abusou da sorte. Esteve toda uma temporada a construir algo grandioso, finalmente a fazer algo decente pelo programa, depois de algum tempo a fazer asneira da grossa, e no final, mesmo mesmo mesmo no final, apenas em metade de um episódio, voltou a fazer asneira da grossa. Compreendo o fascínio pela série e a vontade que deve sentir de querer ficar na história do programa, mas não era preciso isto. Já lá está. É sem dúvida um dos melhores argumentistas e showrunners de sempre da série, alguns dos seus episódios são verdadeiras obras primas, levou o programa a níveis de fama nunca antecipados, e mexeu com as bases da mitologia whoviana de uma forma que se vai sentir durante ANOS…

Portanto, os meus parabéns, caro Steven Moffat. Mas não estragues mais. Ou voltas aos níveis de espectacularidade do resto da temporada (menos um ou dois episódios), ou volta a estar na altura de te ires embora!

Mas vá, é preciso notar que apesar de tudo, achei que o episódio valeu a pena, mais que não seja pela extraordinária primeira parte, em Gallifrey, com um Doctor digno elogios como qualquer outro!

Artigo da autoria de Rui Bastos, membro da equipa Whoniverso