Porque é que Torchwood ainda não me convenceu

15-02-2015 14:44

Spin-offs de Doctor Who são uma excelente ideia, pelo menos em teoria. Durante a série clássica não era algo que se fizesse, mas actualmente faz todo o sentido, especialmente tendo em conta a quantidade de fãs que a série tem conseguido reunir.

De momento não há nenhum activo, e eventualmente vou ver tudo, mas por agora ainda só ando a ver Torchwood (comecei há uns dias a quarta temporada), e a verdade é que ainda não me convenceu totalmente. A ideia é excelente: uma espécie de Doctor Who para adultos, mas que não se deixa definir simplesmente dessa forma. É mais do que isso!

Mas não é uma série suficientemente boa. Eu compreendo que qualquer coisa com o Captain Jack pareça uma aposta ganha, que o actor, John Barrowman, é um dos homens mais porreiros à face do planeta, e que a personagem é das melhores que o universo do Doctor já viu. Muitas das outras personagens são igualmente interessantes, mas há outras que deixam muito a desejar. Como Gwen Cooper, a (infelizmente) verdadeira protagonista, com a qual tenho sérios problemas.

Além de que raramente os episódios são realmente bons, de tal forma que das três temporadas que já vi, só a terceira, mais uma mini-série de cinco episódios do que outra coisa, é que me parece consistentemente boa e digna deste spin-off!

Vamos por partes. A premissa inicial é fantástica: Torchwood, mencionada em Doctor Who, várias vezes, numa linha narrativa própria, é uma organização mais ou menos secreta – os jipes têm Torchwood lá escrito – que lida com ameaças extraterrestres. Tornou-se vagamente maléfica, teve que enfrentar o Doctor, e lá acabou por se tornar mais ou menos boazinha. Eventualmente ficou reduzida a uma pequena equipa chefiada pelo Captain Jack, e especializou-se em salvar o mundo.

Na realidade, a premissa é basicamente “coisas que não podemos fazer em Doctor Who”, desde enredos que envolvem muito sexo, sangue e tripas, até momentos trágicos impossíveis de retratar na série principal, mais kid-friendly.

E não há nada de errado com isso. Mais que não seja é um oportunidade fantástica para explorar uma série de conceitos que são impossíveis de abordar em Doctor Who. A visão que as personagens têm da morte é realmente assustadora e perturbadora.

Mas e o resto? A qualidade deixa muito a desejar. Por cada momento fantástico do Captain Jack, há uma actuação exagerada de Gwen, ou algo parecido. Por cada confront que o Jack, imortal, tem com o passado, há uma Cyberwoman. Enfim. Torchwood foi, no mínimo, esquizofrénica.

Querem saber o que lhe faltou? Consistência. E ser levada a sério. Reparem na terceira temporada, mais curta mas mais intensa. Fantástica! Cada episódio um amontoado de tensão, completamente viciante! Perturbador, claramente uma história de Doctor Who, mas sem lugar na série principal. Uma boa premissa, com uma boa execução e excelentes momentos de televisão.

Só que foi Sol de pouca dura. Ainda vi poucos episódios da quarta temporada e, bem... que palermice pegada. Novamente, uma ideia que até nem é má de todo, mas com uma execução tão, mas tão má, que nem sei. Dá pena, compreendem?

Podia estar aqui algo tão espectacular, e em vez disso temos aqui duas temporadas medianas, uma fantástica e uma, parece-me, fraca. O problema é esta experiência, que correu mal, praticamente ditou o destino dos spin-offs de Doctor Who. A morte de Elizabeth Sladen, a actriz que fazia de Sarah Jane Smith, deve ter sido a machadada final.

Ainda por cima uma série como Torchwood fazia todo o sentido a correr em paralelo com a era Capaldi. Um Doctor mais negro, mais realista, capaz de alegria mas também de amargura extrema, e que já enfrentou uns inimigos que eram, literalmente, cadáveres reanimados e postos dentros de armaduras, depois de se descobrir que as pessoas continuavam conscientes depois de morrerem.

Uma série negra e com mais liberdade podia explorar tão bem tudo o que se tem passado... E no entanto, cá andamos.

Mas querem saber a verdadeira razão para Torchwood não me ter convencido: péssimos vilões. Ou melhor, excelentes vilões usados de forma péssima. É uma constante ao longo da série, principalmente com as duas primeiras temporadas, na quais todas as personagens que podiam dar algum sabor àquilo são, pura e sistematicamente eliminadas. E não há série destas que se aguente sem um bom plantel maléfico.

Por agora é esperar que alguém abra os olhos e decidam continuar a série, mas desta vez como deve ser, em verdadeiro contacto com Doctor Who e outros possíveis spin-offs (fala-se de algo com a River, algo com o Paternoster Gang...) que Moffat e companhia já estão, de certeza, a cozinhar em lume brando. Cá estarei!

Artigo da autoria de Rui Bastos, membro da equipa Whoniverso